sábado, setembro 05, 2020

O PARASITA INOFENSIVO


(Contém Spolier)
Acabo de assistir "Parasita", filme badalado do diretor Bong Joon-ho. O primeiro impacto é de um filme com uma história bem simples, mas que não necessariamente de fácil interpretação. É fato que tudo que se torna muito badalado exige um grau maior de responsabilidade, para não chocar críticos e fãs de todas as espécies. Não sou - e não quero ser - crítico de arte, mas adoro olhar para a arte e dela tomar certos ensinamentos, ou mesmo, conforme entendo a arte, descobrir uma visão do mundo, ainda que contado por metáforas, simbolismos e afins.
O filme de uma maneira geral é bem agradável, contando com elementos do humor, do suspense e do terror; tudo isso envolvido apenas pela tragédia - cheio da dor humana em seus mais estranhos relacionamentos. Na história todos sofrem, seja pela ingenuidade diante do mundo, seja pela necessidade do crime como modo de subsistência. Deixar-se levar pelas circunstâncias, criar certas condições para se conseguir algo motivado por sonhos. No filme, embora trazendo um escalonamento social bem diferentes; pobres, ricos e miseráveis são idênticos em suas ilusões. Um pode viver parasita do outro, numa relação de capital e trabalho; mas o parasitismo só é viável quando parasita e hospedeiro sabem o seu devido lugar na sociedade.
A comédia vira tragédia quando uma das camadas se rebela, mas não faz isso de modo violento, mas sagaz. Toma aos poucos todos os espaços da mansão agindo como se fossem subalternos do ideal patrão e empregado. Quando se rompe essa confiança, ou há a rebelião ou a submissão, de tal ponto à anulação de uma existência: no porão da casa o sujeito não tinha mais sonhos, liberdade ou vida, apenas se alimentava e dormia. Três aspectos numa casa: patrões neuróticos, empregados insatisfeitos e indigente invisível.
Empregados insatisfeitos tomam o lugar dos empregadores, indigentes lutam pela decência: tudo seria muito alegre se compreendessem seus papéis dentro de uma sociedade - no caso a casa - Viveriam felizes, trabalhando e sendo pagos, se alimentando e se escondendo. A ruptura mostra que não iremos ficar satisfeitos com isso, uma hora e outra queremos isolar os indigentes, tomar o lugar dos poderosos, romper a realidade cruel para uma irrealidade fantasiosa. Poucos são os parasitas, mas muitos são dependentes patogênicos: o crime acontece onde não há mais espaço vazio entre eles.

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