sexta-feira, agosto 28, 2009

Espaço branco

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Em vão, clamado, recuo.
Não quero ninguém, ameaço.
Desistiria da vida,
com argumentos improváveis.
Prefiro o silêncio do quê ignorado.
E o pensamento atrofia,
Inconsciente, desiste de tudo.
Como um parco, alguém me vê.
Chama-me pelo nome: eu percebo.
Quer de mim mais alguma coisa?

Já basta a história mal acabada.

E o vão, a chama da incerteza.
Acaba com alguém que ignoro.
Insistiria no improvável, se tudo.
Mas prefiro o silêncio, o silêncio...
E a vontade que eu queria,
Atrofiada no peito, insiste.
Um barco à deriva em mim, resiste.
No pensamento quer alguma coisa
Da história inacabada:

Já não bastam todos os poemas de mim?
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quarta-feira, agosto 26, 2009

Cartas ao Vento 028

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Não há mais amor. Amor que se pode compartilhar. Amor incondicional. Amor do lirismo infeliz dos poetas. O amor da contradição, dos gestos impensados de ciúmes, ou do abraço instintivo da posse. O amor que compreendíamos em duplicidade: felicidade e tristeza. Não existe mais: o amor dos apaixonados, esse amor que mais destrói do que edifica; esse amor inconseqüente. Amor da repartição dos louros, e do desfrute caloroso das desgraças. Amor que não é mais caridade do que compaixão. Esse amor não existe mais.

Pois deixamos de temer a solidão. Esse amor do passado que era nosso único remédio para a felicidade, do convívio feliz e complacente. Hoje temos mais: temos os outros, tantos outros que não nos pertencem. Desfrutam da nossa intimidade. Isso é tão perigoso quanto o mais desprezível amor: dizer o que somos em qualquer intensidade. Nossas almas são dilatadas, em alta velocidade. Amor vulnerável em tempo e espaço, nesse amor que não existe mais.

O amor que eu falo, como se fosse qualquer romântico, é amor que ninguém se admira, que todos discordam. Essa morte do amor como se fosse trágico, mas que na verdade é apenas um sentimento distorcido. Amor que continua mágico, eterno e facilitador; que está cada vez mais distante e dilacerado. O amor que eu falo não é o amor de verdade.

Queria falar do amor de verdade, mas ele é inconcebível nos dias de hoje.
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terça-feira, agosto 25, 2009

Morto

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Venha agora, nesse dia de verão.
Que estarei esperando você.
Sabendo o que precisa ser feito.
Essa sua imagem decadente,
em lances repetidos.
Quem é você em mim agora?
Um desses sujeitos sem concepção?
Esse alguém eu desconheço.
Apesar de estar comigo há tempos.
Esse sujeito sem gestos, sem afinco.
Com olhos tristes e cansados,
Não posso ser esse súdito derrotado.

E o espelho denuncia
a única verdade sobre mim.

Mas venha armado me enfrentar,
pois agora estou disposto.
Mesmo sem ajudante,
que soterra o corpo morto;
quando não existe mais remédio.
Venha com armas, pois verá as minhas.
Em punho como querendo matar.
Escudo de quem precisa se defender.
E cortarei em migalhas esse boçal
de palavras sombrias, insulsas.
Meus olhos tristes matando em mim
esse sujeito que sou eu, maltratado.
Não posso mais ficar derrotado.

E o reflexo foge sem revelar quem é o culpado.
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terça-feira, agosto 04, 2009

Vida em Breve

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Logo estarei bem longe,
não irá demorar muito,
não irá me reconhecer.
Mas ainda não quero despedida.
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Irei andar no universo,
não sei ainda se sozinho;
quem sabe antepassados,
outros amigos.
Só sei que você não irá comigo.
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Logo estarei longe.
Foi bom encontrar você,
como se fosse eterno,
nosso desentendimento,
nossas coisas indo embora:
palavras, sussurros e promessas.
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Irei lembrar de você, sempre.
Mas não me diga outras
aventuras, nem desejos.
Do mesmo modo que nunca
mais serei eu mesmo;
é certo que também nunca
mais vou reconhecê-la.
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Logo, estou tão longe.
A vida que parece eterna;
às vezes, parece tola.
E nesse esquecimento,
quando nossa vida desfalece,
se torna tudo mais breve.
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(2006)