terça-feira, setembro 15, 2015

DESCONECTADO: Como um vício

 

E tornou-se tudo tão superlativo. É verdade, ainda não me acostumei conviver com tantas diferenças. Aqui nada é viver, tudo é paisagem. Tudo tão descritivo: opiniões demais. Mas faz parte da minha vida rotineira, como tomar banho; comer e fazer sexo. Um relacionamento aberto, às vezes, festivo; muitas vezes, não. Curtir, compartilhar e determinar tendências. Tudo é uma certeza excessiva: da moda, da política; do certo e errado. E eu, ao meu tempo, do meu modo; sinto-me cada dia mais ignorante, não sabendo qual minha decisão certeira; pois o tempo passou depressa, e mais algumas palavras ficaram perdidas.

Você lembra quais suas postagens de hoje? Não lembramos. E quando lembramos, por um descuido qualquer da memória, não sabemos sua relevância. Pois nesse mundo de excessos, não é tão relevante quando há inconsciência. Fotos, piadas, músicas, opiniões, reportagens; mentiras. Tudo vai e vem, num replique multiplicador de informações, que deformam muitas vezes aquilo que é essencial: a troca, a conversa, os desejos íntimos. De tantos que aqui comparecem, somos tão pouco íntimos. Como foi o seu dia? Como está o trabalho? Tem vontade de comer o quê no final de semana? Como estão os filhos? Tão íntimas, mas tão ordinárias nossas relações inconstantes. Diga-me sobre você, mas não diga aquilo que os outros estão dizendo, numa manada tão despretensiosa.

Aqui eu vivo nitidamente vigiado. Como se normal nos dias de hoje fosse tanta nudez. Expresso-me sem qualquer receio, pois não será apenas aquilo que eu sou, mas o tanto que me fizeram ser. Por isso, quando digo odiar a segunda-feira, odeio com todo o coração, mesmo quando a segunda-feira for de bom grado. Quando digo contar as horas para a sexta-feira, faço-o como se toda sexta-feira tivesse qualquer produto que me fizesse feliz. Aqui não há espaço para o talvez, nem para o “hoje não quero, estou com dor de cabeça”. Hoje é todo o dia, até o dia seguinte; até a próxima postagem. A escolha; qualquer que seja, é polêmica.

Vigiado, vigiado. Jogo numa centrífuga tudo de mim, minhas escolhas, decisões, medos e vontades. Gostem em mim, triturado aos meus iguais tão desiguais, meu desejo. Em formado único, pulverizado; decido que quero mesmo sem saber realmente o quê. Quero, pois todo mundo quer. Não quero, pois ninguém quer. Tudo ao mesmo tempo, simultaneamente. É assim a vida por aqui, nessas horas que passo com vocês, intercalando o metrô lotado com as centenas de curtidas no texto. Às vezes não são centenas, e isso é a morte. A morte que acontece aqui dentro pode ser a vida que acontece lá fora.

E assim vamos logando, transloucados...





sexta-feira, setembro 04, 2015

Desconectado: Iron Maiden V – The Book of Souls


Devo confessar que me sinto um pouco desconfortável falando sobre o Iron Maiden. Duas situações me levam a isso, a primeira é que conheço pouco de música. Não da história, mas dos acordes. Portanto, falar sobre técnica, riffs, graves e agudos; cowbell é um grande enigma para mim. Outra coisa, falar de uma banda que eu escuto há mais de trinta anos, mais difícil ainda. Tudo soa como blasfêmia, de quem perdeu o respeito aos mais velhos. Mas vou anotando, dizendo aquilo que penso, como se libertário fosse. Eis que estou aqui, com mais um álbum completo, diretamente aos ouvidos, existindo por nós, os fãs: The Book of Souls – Iron Maiden.

Acho que o fã é um estereotipo incompreensível. Todos os tipos e de todos os modos. Fã do Iron Maiden não gosta de levar desaforo, mesmo quando a banda faz algo errado. Foi assim que eu me senti quando ouvi os piores álbuns da banda, tentando achar ali alguma coisa que salvasse a reputação de ser fã. É claro que a idade nos dá uma clareza estranha, até mesmo quando o subjetivo parece dominar todo o parecer. Pensando em tudo isso, decidi refletir sobre Iron Maiden. Sem medo de dizer a verdade, pelo menos a minha verdade.

Assim, posso afirmar a existência de cinco fases do Iron Maiden. E esse disco, lançado agora mesmo, The Book of Souls, faz jus de forma magnifica a última Era, que começa com o retorno de Bruce Dickinson aos vocais, em 2000. Fase I (1980-1981), Fase II (1982-1988), Fase III (1990-1992), Fase IV (1995-1998) e Fase V (2000 – Atual). A decisão de detalhar as fases é uma forma de passar uma informação importante: Estamos há 15 anos na fase do Iron Maiden e seu relacionamento conturbado entre Hard Rock, Heavy Metal e Prog Metal.

Se eu não me engano, poucas resenhas tratam o novo álbum sem compará-lo com a segunda fase, a mais grandiosa e certeira da banda. Poucas resenhas tentam desvincular o Iron Maiden II (De 1982 até 1988 - E lá se vão quase trinta anos). Por isso, resolvi escrever sobre o álbum, pois ele me pareceu o clímax da quinta fase, onde músicas longas são apresentadas, mas sem serem cansativas; onde o hard rock é apresentado, sem parecer tão comercial; onde o Heavy Metal é tocado, sem parecer nostálgico. Um amadurecimento dos seus membros, evidente. O romance com o rock progressivo, que teve seu namoro com o Seventh Sono f a Seventh Son, pode ser colocado a sociedade, sem medo de críticas e arrependimentos. O Iron Maiden não é mais a banda que tinha suas características no punk, heavy metal tradicional inglês e uma agressividade pungente. A banda agora é aquilo que há de melhor para o Heavy Maiden. Absolutamente um estilo único.

E já que falamos em fases, nada melhor que localizar o álbum exatamente em sua Era, que se inicia com Brave New World (2000), o menos experimental deles; até o The Final Frontier (2010). E nessa comparação não há menor sombra de dúvidas que The Book of Souls é o melhor álbum de todos. Não sei qual a motivação individual, mas a verdade é que vemos todos os integrantes em sua melhor apresentação. Poucas músicas, desde então, me fizeram prestar atenção nos instrumentos de forma isolada, apreciando cada passagem de cada músico. Poucos álbuns, dentro da nova fase, me trouxeram o prazer de escutar um álbum mais de uma vez, trazendo à tona nostalgia de grandes grupos, não apenas do Iron Maiden. Vi Black Sabbath, Deep Purple, só para ter uma ideia. Mas antes de tudo, ouvi Iron Maiden em sua nova fase, definitiva em sua quinta geração de álbuns. Devo pensar que, como fã, estou exagerando um tanto; mas qual é o problema, todos os fãs são um tanto exagerados.

As primeiras informações que surgiram sobre o novo álbum eram antagônicas. Ao mesmo tempo em que se ouvia que o Iron Maiden apresentaria músicas longas num inusitado CD duplo, surgia a notícia sobre a doença do vocalista. Bruce Dickinson tratando um câncer na garganta. Era de se esperar que os vocais fossem menos exigidos (embora tenha descoberto a doença posteriormente); trazendo para o álbum as famosas e terríveis introduções dos últimos álbuns. Cansativas e desnecessárias. Neste álbum, boa parte das músicas possuem essas introduções, mas longe de serem detestáveis. A base do Iron Maiden enfim estava evidenciada: Bruce Dickinson numa fase esplêndida, Nicko McBrain aparecendo muito, Steve Harris galopando, Guitarras certeiras e melodiosas. Tudo muito bem feito. Músicas longas, mas música muito bem executada. Por isso eu afirmo, o novo álbum não serve para quem tem pressa. Não serve para serem escutadas no carro, indo para o trabalho. Não serve para quem tem hora marcada.

O álbum começa com uma música de pouco mais de oito minutos: If Eternity Should Fail”. Diferente dos outros álbuns, em que a primeira música era agressiva e rápida, esta começa com uma introdução que lembra algo tribal, com Bruce Dickinson cantando sem nenhum instrumento. Quando a banda inteira aparece, eis que temos Iron Maiden em sua maneira mais clássica. Considero uma das melhores músicas. Riffs poderosos e um refrão característico. Música caberia na segunda fase, em qualquer álbum. Não faria feio na Fase de Ouro. Nota 10.

A segunda música é “Speed of Light” – Escolhida para ser o single, inclusive sendo liberada pela banda num clique muito interessante sobre os games da década de 80. A música é direta, rápida e o tipo de música, que em outros álbuns, seria a primeira a ser tocada. Curiosamente é a música que eu menos me identifiquei, embora muito interessante. Nota 8,5.

“The Great Unknow” – Marca evidente da quinta fase da banda. Poderia ser colocada em qualquer álbum de 2000 para cá. Embora de qualidade muito superior. Enquanto as duas primeiras músicas mostram a participação dos membros do Iron Maiden, esta parece ser uma composição exclusiva do patrono, Steve Harris. A cara desse novo Iron Maiden, prog metal, introduções e afins. Se vocês não gostam dos últimos álbuns devem estar torcendo o nariz para a música somente pelos meus comentários. Mas não se enganem, esse álbum é muito bom, e até mesmo uma música com a cara dessa Nova Era Maideana, soa com um hino clássico. Quando a música começa, temos o verdadeiro e irreconhecível Iron Maiden, Nota 9,5.

Outra música que nos remete mais ao Iron Maiden da segunda fase (exceto pela introdução), “The Red and The Black não traz nenhuma surpresa, nenhuma reconstrução daquilo que já ouvimos antes, no entanto, é a música com cara de Piece of Mind que o vocalista disse em entrevistas (Em entrevista, Bruce Dickinson disse que Speed of light tinha cara dos anos 80). Como sempre, música feita para shows, pois o clima todo é contagiante e grandioso. Mais uma vez a presença marcante do sétimo integrante, trazendo os teclados para preencher os espaços entre os solos e afins. Aliás, mais uma vez grande presença dos guitarristas, nas batalhas já conhecidas da banda. Nota 9,5

A quinta música nos remete a fase quatro do Iron Maiden – Tudo ali parece caber nas linhas vocais de Blaze Bayley, um pouco mais alegre. Talvez por isso considere “When The River Runs Deep” o ponto fraco do álbum. Vale ressaltar que a música não é ruim, mas se compararmos com tudo que foi apresentado até então, sua qualidade é muito inferior. Iron Maiden direto, rápido, pesado e simples. Poderia também ser um single, com retoques mais de heavy metal que hard rock. Nota 7,5.

A faixa título, “The Book of Souls”, dá um certo calafrio com sua introdução. Trauma dos últimos álbuns do Iron Maiden e suas despretensiosas introduções. No entanto, no caso específico, temos uma belíssima introdução acústica que serve para trazer uma das melhores canções do álbum. Batalha de solos, vocais claros e melódicos. A música tem tudo para ser uma das mais emocionantes nos shows. Outra vez o dinamismo da música não nos permite questionar os dez minutos da faixa. Assim como aconteceu com Seventh Son, os teclados dão uma estrutura para todo o acompanhamento. Vale a pena decorar a letra, cantar junto, se arrepiar. Encerra-se a primeira parte do álbum. Nota 10.

Mais uma faixa intermediária, entre o Iron Maiden progressivo, do estilo dos últimos álbuns; e o Iron Maiden que agrada os fãs mais novos, recém adquiridos com o já longínquo Fear of The Dark. “Death or Glory”, música pesada, rápida, nervosa; com tudo aquilo que os mais ávidos roqueiros querem. Cara da carreira solo do Bruce Dickinson, mas com algo bem específico do Iron Maiden. Interessante, embora tenha passado desapercebida por mim numa primeira audição. Não faria falta, ainda que eu considere importante na divisão entre “as porradas” e as “músicas trabalhadas”. Refrão típico. Nota 8,5

Os anos 80 voltaram! Descaradamente “Shadows of The Valey” poderia ser gravada na época do Powerslave ou coisa do gênero. Cara completa da fase mais famosa e empolgante do Iron Maiden. Pura nostalgia. Se dissessem que a música estava gravada em algum lugar do passado, e que tivessem encontrado a “fita k-7” e a regravaram, não seria nada impossível. Quando o álbum parecia ficar cansativo, eis que aparece um respiro, um alívio; um estimulo qualquer dizendo: fique ainda, coisas interessantes virão! Mesmo que você odeie a nova fase do Iron Maiden e que não queira saber desse álbum, escute essa música pelo menos umas duas vezes (uma das poucas músicas com final clássico, sem rodeios). Nota 10.

Depois da magnífica faixa anterior era de se esperar que a expectativa em relação a próxima música. “Tears of a Clown” não chega a ser ruim, mas é altamente frustrante. Volto a lembrar que a fórmula encontrada em intercalar músicas longas com músicas simples, pode ter dado certo, mas aos ouvidos mais atentos, para essa música em especial, fica a impressão que alguma coisa ficou faltando. A música mais curta, embora mediana, não chega comprometer o álbum. Traz um belíssimo solo de guitarra. Nota 7,5.

Música para mostrar o quanto vocalistas como Ian Gillan e Dio foram importantes para Bruce Dickinson. “The Man of Sorrows”, trouxe um Iron Maiden adepto às influências dos anos 70/80 de bandas clássicas, rock simples e direto; menos melódico; com cara de “balada”. Ainda que (Graças aos Deuses do Rock), não tenham caído no erro de regravarem um Wasting Love II. Não vou dizer que é o ponto alto do álbum, mas como estamos falando da melhor obra pós-2000 do Iron Maiden, temos que ter uma certa exigência em relação a tudo que é apresentado. Vale, sim. Escutei diversas vezes, meio com cara de Whitesnake melhorado, o que não é difícil. Nota 7

Meu Deus! “Empire of the Clouds” é uma coisa que nunca pensei em ouvir num álbum do Iron Maiden! Mas é uma surpresa extraordinária. Música mais longa, com quase dezoito minutos de uma verdadeira ópera rock. Tem violinos, acústicos; piano. Bruce Dickinson demonstrando o motivo de ser considerado um dos melhores vocalistas de todos os tempos. Um início calmo, sento-me tranquilamente no sofá, a música por si valeria todo o disco. A música vai evoluindo, mas diferente do que se pode imaginar, não conseguimos perceber nitidamente a passagem da música, as suas mudanças. Beleza impossível de se comentar, creiam. Não é Iron Maiden clássico, não é Iron Maiden progressivo; mas é Iron Maiden que cria uma obra de arte, cheia de enigmas, sons e uma forma incomparável. Nota 10.

Como eu disse anteriormente, o álbum faz parte da fase em que o Iron Maiden teve as mais sérias críticas em relação ao estilo musical. Há sempre o questionamento em relação ao tempo das músicas, a necessidade das introduções; passagens desnecessárias. Ainda que esse álbum tenha as mesmas características tão comentadas nos álbuns anteriores, considero que enfim puderam cravar com todas as letras a possibilidade de gravarem grandes músicas sem precisarem se preocupar com o tempo que as pessoas gastariam para escutar. Escutar “The Book of Souls” não será perda de tempo. O álbum é simplesmente incrível, desproporcional aos sons pasteurizados que temos ouvido ultimamente. As músicas são livres e belíssimas, empolgantes. É a correção da Era Maiden V, progressiva, única e sem qualquer comparação. ÁLBUM NOTA 9