sábado, setembro 05, 2020

O DILEMA DA SOLIDÃO

 

Muitos feitos a solidão tem me causado, não necessariamente todos bons. Só o tempo poderá dizer que ser surgiu dessa estranha sensação – mundial - de impotência. Vejo-me olhando os outros, me sentido tão, ou menos ainda importante diante da vida, que em um sopro; ou num instante, não manterá mais nenhum conceito de pé. Tudo será novo, motivado pela reflexão do agora, nesse mundo tão repleto, mas ao mesmo tempo tão isolado. Bem-vindo ao novo milênio, os filhos da quarentena mundial. Todos estão convidados a olhar o quanto o concreto pode ser abstrato.
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O isolamento social me fez deparar com um sujeito desconhecido, mas com qualidades e defeitos bem mapeados: eu me descobri em meio a pandemia. Olhei para minha profissão, minha posição dentro da sociedade, meu personagem lidando com tantas pessoas em minha volta, e por mais absurdo que possa parecer, aquele do passado não era meu. Sou esse sujeito agora batendo de cara com uma realidade tão difícil, mas ao mesmo tão comum em nosso histórico humano. Adianta descrever outras tantas epidemias e mortes se em nenhuma delas eu convivi comigo mesmo? A história agora é nova e duvido que não degrade a mente que se achava poderosa, mas que desviada do caminho, estava entendendo tudo errado da vida.
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É como escolher a pílula azul e descobrir a "Matrix" que nos envolvida, dominava e conduzia, mas não sabíamos até onde ia o seu potencial. É assim que cientistas da moda, ou sociais; ocultistas oportunistas, ou religiosos, irão olhar para o mundo: eis que só sei que nunca soube de nada. É um puxão para baixo, como quem acorda e cai da cama, como quem não mais consegue resolver uma simples questão matemática. Nunca fomos bons em saber sobre a existência, hoje sabemos menos ainda.
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Que serei daquilo que sobrar desse maremoto psicológico que me toma as noites insones? Que virtudes cooperarão para que minha vida, ou minha morte, seja mais tranquila? Novos condicionamentos menos incertos? Olharei para a vida como ela não deveria ser, mas estava sendo? Que grupo de amigos manterei por perto para me sentir mais seguro, amado e respeitado? Que atitudes terei que mostrar ao outro para lhe dizer que sou necessário? Como afinal quero ser lembrado pelas pessoas? Isso importará no futuro? Qual a maior oportunidade em estar comigo agora e só ter essa companhia tão desconhecida para conversarmos sobre nós mesmos? O mundo cheio de conhecedores, formadores de opiniões e gente com tanta certeza, mas que não aprendeu a lidar com tanta incerteza: o dilema da solidão é saber se somos boa escolha para nós mesmos.
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Eu não sei realmente se dois ou três meses de mortes enfileiradas é capaz de corrigir tanta incoerência, mas eu sei que não sairemos iguais. Grandes mudanças nas pequenas mentes e pequenas mudanças nas grandes mentes: o despertar de quem já é grande será dolorosa, minuciosa e cirúrgica. Quem é ralé da humanidade olhará tão pequena é sua influência sobre os outros, que nem seu dinheiro, muito menos o seu prestígio, farão deles seres essenciais nas discussões delirantes dos poetas, dos mágicos e dos professores. As pessoas bastam, as coisas satisfazem. Se sobrar de mim algo que todos adorem, estou tão repleto de desumanidade que é bem provável que a pandemia me causou poucos efeitos colaterais. Deverá sobrar de mim algo diferente, que o ordinário odeie e a monotonia despreze. Não quero mais inúmeros amigos, nem quero ter tanta certeza da minha crença, pois a incerteza é hoje aquilo que me fará mais forte.


02.03.2020

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