terça-feira, maio 14, 2019

GoT: Conceitos dramáticos - parte 1

(Contém spoiler penúltimo capítulo)
Quais os conceitos devemos observar para entender se uma história é bem contada? Que elemento dramático nos faz passar horas, ou no caso específico, anos acompanhando um enredo? Que personagens temos afins? Para quem torcemos e quem queremos humilhados? São inúmeras perguntas que fazemos quando assistimos uma série tão completa como Game of Thrones.
Evidente que não quero esmiuçar personagens, etapas e explicações dos motivos e das consequências de cada resultado desse penúltimo capítulo. Para isso podemos contar com inúmeras publicações especializadas. Quero mostrar uma visão tão genérica, mas não menos elucidativa.
A resolução de uma guerra pode ser observada por ângulos diferentes, dos vitoriosos e dos derrotados. A guerra é ápice de uma história quando dá ao vitorioso unanimidade em sua vitória. Foi mais ou menos a impressão dessa primeira parte de uma briga pelo trono de ferro: não sobrou derrotados em uma guerra avassaladora que extinguiu o território conquistado.
Se o mundo parecia ganhar do seu principal inimigo no campo de batalha dominada pelo gelo, é no fogo que tudo se consome. Pelo fogo uma cidade inteira devastada, distribuindo pelos cantos mortos e feridos. Tirania, loucura, raiva e o ódio conduzindo uma dominação. Que vantagem liderar uma terra destruída?
Uma história bem contada precisa de um início, um meio e um fim. Mas precisa de caminhos tortos e muitas vezes uma incompreensível escolha dos personagens justificando tal escolha. Só uma reviravolta elimina a mesmice simplória que conduz um final previsivel. E ela só acontece quando temos um personagem forte que não é linear, possibilitando ações impossíveis, embora justificáveis.
A primeira parte da grande final nos mostra muitos desses personagens, de vilões que perdoam à heróis que falham. É matéria-prima que bem conduzida poderá nos dar um desfecho ainda mais surpreendente. Talvez um final comum e determinado pelo bom-mocismo. Talvez uma heroína tão excêntrica.
Talvez nada disso.

domingo, abril 28, 2019

Vingadores: Ultimato não é apenas um filme.

(Contém spoiler - Não leia se não assistiu o filme)


Não estamos falando de um filme. As pessoas ali presentes não estavam esperando uma história bem contada, com ação e choro, com justiça e paixão. Elas não estavam esperando nada disso, pois o filme é na verdade um evento. Um acontecimento que encerra um ciclo longo, que em muitos casos, passou por mais de dez anos na vida de algumas pessoas. Mas o filme foi além, ele foi tudo que esperávamos de um entretenimento. Ele tirou de nós a máscara e revelou defeitos e qualidades humanas ao mesmo tempo que divertia e fazia chorar. O filme começa melodramático, mas isso pouco importa. Enquanto os super-heróis tentavam seguir a vida numa boa, o fantasma dos últimos acontecimentos, que dizimou metade da população mundial, os assombrava. Era impossível não fazer nada, afinal de contas eles são os salvadores do planeta. A síntese de todo enredo "loser" ficou para Thor. Nunca vi uma antítese ser tão bem contada: Um Deus e um Bêbado. Do corpo másculo e indestrutível num bonachão covarde e embriagado. As metalinguagens foram se formando durante todo o filme: do fracasso ao sucesso e da derrota até a vitória. Um grupo salvo pela esperança. Existia ali naquele clube de heróis uma determinação já consumida pela humanidade real. Por isso, nunca precisamos de tantos ídolos como estamos vendo agora. E talvez por isso, desde sempre, o sucesso com personagens surreais, destemidos e com poderes sobrenaturais. Mas ali estavam os fracassados, tentando seguir a vida como se nada tivesse acontecido. Essa primeira perna do filme é desgastante para muitos que querem sentir o gosto da ação, mas não menos essencial para o entendimento da história. O filme se baseia na volta ao passado, tão discutido em vários filmes, teses e seriados. Sabendo disso, o próprio enredo se encarrega de zoar essa possibilidade. Aliás, a pitada de humor serve para destoar algumas partes tão sombrias e deprimentes. Então, o passado é a grande sacada dos heróis. O passado é também a grande ideia dos telespectadores: muitos deles foram buscar nos mais de vinte filmes soluções para enfim destruir o Thanos. Mas pasmem, a primeira grande ação do filme é a morte do grande vilão, Por essa ninguém esperava. A volta para o passado sempre é uma situação confusa e conflitante, por isso não se apeguem a teorias quânticas e explicações lógicas sobre o Paradoxo do Pinóquio. Estamos falando de um filme de super-herói, de um filme de ação; não de um filme de filosofia. Eles voltam e tudo acontece mais ou menos como eles queriam. Se tivemos uma primeira parte lenta e explicativa, a segunda parte é pura adrenalina. Não existe um só minuto que as pessoas não pensam em levantar das cadeiras e ajudar na batalha. O primeiro ponto da emoção: a chegada de todos os heróis que haviam desaparecido com o estalar de dedos do Thanos. A platéia se levanta, vibra e chora. Chorei pela primeira vez, mas foi algo contido. Afinal estamos falando de um filme de heróis, ninguém chora. A batalha segue e tal como acontece nos grandes épicos, um show de imagem, efeitos e sons. Não dá para perceber que já estamos mais de duas horas olhando para a tela do cinema. Não dá para perceber que estamos ali, torcendo e vibrando e totalmente submersos num mundo de imaginação: eu choro pela segunda vez, pois agora eu sou uma criança. A comoção da vitória é a morte do segundo herói: depois da Viúva Negra sendo trocada pela joia da alma, o Homem de Ferro tem a revelação mais surpreendente de todos esses anos: ele era única chance de derrotar Thanos. A sua morte era o que Doutor Estranho tinha visto no momento em que foram derrotados no Guerra Infinita. A única chance era aquela que ele não queria revelar: a chance era o Homem de Ferro pegar todas as joias e fazer tudo voltar ao normal. Choro, um silêncio sepulcral toma conta do cinema. Toma conta de mais de dez anos de nossas vidas. Um filme de heróis ninguém chora, pois em filme de heróis ninguém morre. Mas estávamos ali vendo mais que um filme, estávamos ali vendo um evento.Daquele momento em diante a vida passa por nossa cabeça. Todos os personagens alinhados vendo a despedida do Tony Stark. Ele não era mais um super-herói indestrutível, mas era como muitos de nós, vitorioso. A vida não é um filme, mas às vezes precisa ser.

10/10 .