terça-feira, setembro 29, 2009

Descaso

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O abandono é qualquer momento.
Noite, madrugada e dia.
Sumir correndo em rebeldia, negar
qualquer culpa e sofreguidão;
partir sem deixar vestígios.

O rastro, apagado pelo incêndio,
desfeito pela chuva; em vão,
a pegada infinita dos caminhos.
O abandono não queixa testemunha,
Nem parentes, nem desculpas.

O abandono, por si, é moléstia.
Para todos nós, recompensa.
Enraizados no desamparo,
sumidos, exorcizados; tristes.
Solitário como prêmio macabro,
da cabeça na parede,
na ausência do corpo que sustente.

Enfim, procuro meu descaso
Do víeis disforme, doentio
E nele procuro minha companhia
Do grito sufocado na garganta,
Do amor que não partiu...
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sexta-feira, setembro 11, 2009

Aos Amores

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Estou com uma ferida enorme
Nasce no braço, não sei onde termina.
Estive pensando que essa dor,
Que não existe ainda,
Era essa ferida enorme.
Os olhos podem vê-la pulsando.
Essa ferida estranha e insensível.
Que percorre a barriga, desce
Até a ponta do pé, queimando.

Eu estaria voando, mas a ferida...

Ela lateja, incomoda; estaciona.
Então eu peço que me ajude,
Com essa ferida terrivelmente feia.
Mas da minha boca, a ferida que cresce
Diz palavras que ninguém consegue decifrar.
A ferida enorme, que nasceu no braço;
Criando pus no canto da boca,
me afago...

Eu seria vivo, mas a ferida....

Então, vou assim desse jeito.
E a ferida tomando conta,
Às vezes sendo eu mesmo.
E o que nasce no braço, e não sei
onde termina, vira um pouco de mim
que sufoca a ferida.

Ela estaria morta.....
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quarta-feira, setembro 09, 2009

Lápis

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Da minha infância,
Qualquer erro e descaminho.
Lápis, da pedra que risca o chão,
Da pedra, que dá seu nome,
Rabiscados sem motivo.
Era um poema,
E eu não sabia de quem.

Que me representa no papel branco.
Que me faz cores, na carreta;
Na igreja, no caminhão e céu.
O lápis que contorna minha casa,
Protegendo-me de fantasmas,
Que o lápis não consegue desenhar.
O lápis, que era minha espada,
Hoje não existe mais.

Da minha infância,
Era tão fácil ser feliz para sempre.
E escrever para sempre,
E decidir que para sempre existirá.
E da pedra, que tirei o nome,
numa pedra filosofal tão mais simples.
Que ficou para trás.

Era meu modo fácil de apagar a memória.
E representar no papel branco,
O que hoje não sinto mais.
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terça-feira, setembro 08, 2009

Renascimento

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Assopro o fogo, desisto.
Da vela na mesa, sem morto.
Rezo pelos dias que passam.
E os pesadelos que ficam.
Nos meus olhos, o rosto encoberto.
Não é paixão, mas arde.
Desconheço o caminho confuso,
E da vida nem preciso de dinheiro.
Mas num momento tortuoso,
Em que a fome bate no estômago;
Dane-se a imagem das palavras,
As delicadezas rimadas,
E o sentimento quase falso.

O poeta morre quando a vida começa.

E o fósforo de novo, como guia.
A cruz na lapela como escudo.
E se ouço tantos outros sofrimentos,
Percebo tarde que não resisto.
Tomem meu corpo, alma e sonhos.
Façam o que quiserem no eu desnudo.
Que o mundo me amordace sem receios,
Mas que não me tirem a música do poema.
Desconheço minhas falas desde ontem,
E dano-me na palavra sem regalo.
Ora o poeta visto em forma;
Agora o homem disfarçado,
Sem sentimentos......

O homem renasce onde o poeta morre.
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