Numa época
distante, não no nosso tempo moderno; dois filósofos disseram assim: “Coragem,
enfrentamos o mundo e vencemos!” Não foram exatamente essas palavras, mas o
sentido é muito próximo. Abrangente, é verdade. Dizendo isso quiseram mostrar
para todos os seus seguidores que existe sim uma luta, que existe um inimigo;
mas que existe a possibilidade de vitória. O cotidiano nos oprime, irrita;
fadiga. Mas é o mesmo cotidiano que nos dá a possibilidade em aprender. Como
diz a música: “A lição sabemos de cor, só nos resta aprender”. Essa luta entre
certo, errado; justo e injusto e tristeza e felicidade. Sabemos o conceito de
todos os termos, mas ainda não sabemos como lidar com eles.
Um deles, o filósofo,
foi envenenado: condenado por um crime que ele não cometeu. Olhou para os seus
discípulos e disse que estava feliz ante a situação, pois estaria muito triste
se a condenação fosse justa. Que grandeza, que espírito e que sabedoria. Mais
ainda: que fé! O sujeito se vangloriou diante da morte, ensinando que estava
morrendo por uma condenação injusta, ou seja, saia do mundo mas jamais sairia
como criminoso. A virtude, segundo socráticos, pré-socráticos e afins, era a
verdadeira finalidade do ser humano. Qual a sua virtude? Agora, neste instante;
observando tudo que você fez, faz e pensa. Qual motivo de felicidade que você
carrega em si, que não pode ser tirado? Pense antes de responder, isso é
essencial para sua vida. Coragem, eu enfrentei o mundo e venci! – eles
disseram.
Notoriamente um
outro filosofo, mais metafísico e místico, trouxe o mesmo comportamento,
centenas de anos depois. Humilhado, derrotado, sangrando, chicoteado e
moralmente abalado; olhou seu sofrimento e teve mais medo por aqueles que o
condenavam do que pela sua própria condenação: “Pai, perdoa-lhes; porque não
sabem o que fazem”. Bravura diante do mundo, diante da maldade, diante daqueles
que substancialmente deveriam amar. Pôs-se diante da morte, dizendo aos
discípulos: Coragem, eu enfrentei o mundo e venci! Ele venceu: vive até hoje.
Mas como o mundo
pode ser tão perverso? O mundo é um inimigo? As ruas, as calçadas, empresas;
pessoas e animais, gente; carros, televisão e tudo que temos noção é,
indiscutivelmente, nossos maiores inimigos? Pelo contrário: não há nada de ruim
no mundo, pois até nas coisas mais simples existe a complexidade do Universo,
sua criação. Criação de quem? Não convém a discussão, embora convém à
consciência. Já imaginou a solidão que é a vastidão do Universo se, além das
pessoas que amamos e odiamos neste planeta, só existir o nada? O mundo foi
vencido não por ser ruim, mas vencido pela tentação e pela distorção que
causamos nele. Queremos determinadas coisas aconteçam da maneira como desejamos,
muitas vezes com razão; mas nem sempre. Queremos o melhor do mundo, mas
queremos que o outro mude conosco, quando na verdade essa possibilidade é
impossível. Um outro filosofo mais tarde disse: “Não vos conformeis com este
mundo, mas transformai-vos....”. Não adianta querer mudar todo mundo quando não
temos ainda condições de nos transformar intimamente.
A publicação de
hoje é específica, diferente dos outros textos; está ligado ao ensinamento de
que, alvo de qualquer maldade, devemos saber lidar com nossa conduta, ao invés
de julgar a conduta do outro. Ao olharmos para uma situação que nos agride, nos
entristece; um julgamento tão penoso, é comum olharmos para quem condena com
ódio, rancor e um sentimento de vingança. Normal e natural para o ser humano.
Mas, mesmo assim, não convém. A resposta odiosa ao outro é a homogênea recusa
ao bom. Se não há condição de perdoar, amar; que haja a primeira opção de
ignorar. Não saber, sentir e usufruir do mal que nos é imposto é uma guerra que
travamos no mundo, onde aprendemos a lição.
Coragem! O mundo
em suas tentações, ódios e desavenças foi vencido: Já nos mostraram isso um
dia! E a lição, ainda que pareça tão distante de nossa prática; não é um
absurdo. A lição de amar os inimigos, a outra face; esquecer daqueles que nos
condenam. A lição de nos melhorarmos, e se possível, melhoramos tudo em nossa
volta: todos aqueles que nos odeiam, que, a priori, deveriam nos amar. Amar
como se amam; pois muitas vezes, odeiam como se odeiam.
Coragem!