domingo, abril 29, 2007

Teatro

O teatro é feito para as pessoas que mentem.
Não uma mentira malsoante que humilha a profissão
do artista.

Mas a mentira de não ser real.
A mentira de trazer o que não é bem, ou o que não é mal
como se tanto faz quem é o santo ou o demônio.
Mentira de perdoar e de amar tão facilmente como matar e fazer
sexo.

O teatro é palco da mesmice cênica de nossas paixões.
Como poderia existir alguém que acreditasse que o teatro é
coisa séria para os sentimentos humanos, sendo que ele
é o próprio sentimento humano?

Ninguém.

Falo do teatro como penso meu poema:
Inútil, desacreditado e ridículo.





(Tempo Todo, pg.18 - Sergio Roberto)

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sexta-feira, abril 27, 2007

Carta ao Vento 001

Ando meio desperto. Não sei que mal me afligiu nos últimos dias que me deixou assim: sem razão nenhuma para continuar escrevendo. Acho até que isso seja passageiro, uma coisa de artista, que foge de vez em quando do comum para ser questionado, visualizado; até mesmo ignorado. Creio ser uma grande vantagem um dia ser ignorado. Mas o êxtase mesmo é a crítica: ando sentindo falta delas.

Estou escrevendo um novo romance, para quem me conhece sabe que receberão em breve por e-mail. Já chamam por ai de novela internética. Daqui a pouco é moda, todo mundo escrevendo umas histórias, mandando pela internet para um grupo seleto de amigos, esperando cartas de agradecimento, elogios e coisas mais. Fico contente com isso, logo pensarão que copiei alguém.

Espero que no futuro lembrem quem começou tudo isso.





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quarta-feira, abril 25, 2007

Carta Qualquer

Chegará qualquer dia, uma carta.
Escreverei com olhos para o infinto.
Lá esconderei mistério, e coisas que
quero não dizer, dizendo.
Não se perca, ao ler minha carta.
Nela, larva andará pelas palavras
transformando-se em água potável.
Ela não será em vão, minha carta.
Poesia virará poema, e os sonhos
continuarão onde nunca deveriam.
Os beijos, como serão os beijos?
Em minha carta, que não carregará
nenhum perfume, remetente ou destinatário.

Todas minhas cartas poderiam ser inúteis.

Chegará quase dizendo nada,
nem que verdade ou mentira.
Na medida certa, dirá apenas
o quê desejam tanto ouvir.
Ela não será não, essa minha carta,
para beijos, sonhos e destino.
Mas cairão na armadilha, como
quase todos já caíram até agora,
quando acreditarem que ela diz tudo
que um dia senti de verdade.

Todas minhas cartas são quase inúteis para mim.







PAC da Educação

Governo Federal vai liberar mais dinheiro para a educação. Não me lembro em minha fase política, que começou há dez anos pelo menos, de ouvir uma história como essa. Governo liberando mais recursos para educação? Só pode ser história da carochinha. Mas é verdade, é melhor ainda, parece que o plano de recuperação do ensino é um dos melhores dos últimos anos. Está bem, estou exagerando; admito que li pouco sobre a nova proposta do governo, e sei apenas pelas críticas de comentaristas, que pessoas sérias e conhecedoras da economia e política nacional, receberam toda minha credibilidade.

Diz o novo plano, que também foi batizado de PAC, que haverá um reestrutura na liberação de recursos, criação de medidas de avaliação de desempenho do ensino fundamental e projeto de melhorias profissionais para os professores. Na questão dos recursos federais, tínhamos no passado o seguinte critério: quanto maior dificuldade da região em implantar um sistema forte de educação, maior era o recurso. Ou seja, desde que fosse falho, corrupto, incapaz, desorganizado e ineficiente, maior era a premiação do governo.

O governo agora quer fortalecer os melhores e exigir maior trabalho para os piores. Assim, quanto maior for o desempenho de determinada região, quanto maior for o esforço em se ensinar, maior organização e aproveitamento dos recursos; mais eles sairão vitoriosos. Os piores precisam trabalhar primeiro, para ganhar depois. Portanto, acaba o sossego dos administradores de ensino em regiões críticas, pois não receberão mais dinheiro algum do governo sem fazer esforço. Considero, portanto, a melhor medida essa inversão papéis, o pior precisa melhorar e o melhor recebe o troféu.É claro que isso tudo é ótimo no papel.

Não é difícil encontrar pedagogos, educadores e pessoas ligadas à área de ensino dizendo que o Brasil está tão perdido em matéria de educação que, qualquer idéia que surja para mudar a estrutura atual, será vista com bons olhos. Para esse novo projeto, todos são unânimes em afirmar que, por melhor que seja; apenas servirá para corrigir algumas injustiças no repasse de recurso, criando um inocente critério na avaliação de estudantes e fortalecendo timidamente a formação dos professores.

O risco econômico no futuro está no aprimoramento da educação, basta olhar exemplos práticos dos países asiáticos que cresceram muito nas últimas décadas; pois enfrentaram o problema da educação de forma séria e vigorosa. Eles foram capazes de revolucionar o ensino utilizando-se da decisão política como se fosse de um ditador; com critérios dos diplomados, a pretensão dos visionários e a força do povo. Não dá para arrumar um país apenas por decreto, sem a participação daqueles que vivem o problema.

Exatamente por isso considero que o plano de recuperação de ensino, que o governo está contando para os ventos como uma coisa inovadora; apenas como uma proposta de melhoria, mas não de revolução. E parece que nossos governantes estão ficando especializados nesse negócio, pois fizeram há pouco tempo a mesma coisa com o PAC da economia, que significava coisa nenhuma.

Os meios de comunicação não poderiam tratar melhor esse projeto, ignorando-o. Uma notícia aqui, outra acolá. Mas nada de botar duas horas e meia alguém na televisão explicando, criticando ou apoiando o PAC da educação. Ele merece apenas o mediano, como qualquer outra medida séria do governo que seja tão diminuta. Agora, a questão da educação merece maior respeito, principalmente daqueles que sabem como motivá-la. Não é apenas uma questão política, mas de cidadania. O povo é quem coincide a história, e por isso ele não deve continuar despreparado por muito tempo.

sexta-feira, abril 20, 2007

Adeus, Rosa

O jardim da minha casa era muito bem cuidado. Lembro de minha mãe acordando muito cedo para trabalhar com a terra. Cortava, regava e manipulava todo tipo de planta. Era muito florido e cheio de vida. Minha mãe tinha um carinho especial pelas rosas, dizia que sempre houve quem gostasse e admirasse essa flor, pois trazia consigo mistérios, beleza e aroma. De alguma forma as rosas são muito parecidas com as pessoas, principalmente as mulheres. Contava-me longas histórias comprovando essa tese.

E a comparação para ela não parava por ai. Dizia que qualquer planta poderia nos ensinar muito mais sobre os humanos do que poderíamos imaginar. Há determinados vegetais que quando colocados ao lado de outro, que não de sua espécie, perdem o brilho e acabam morrendo. Precisam de vitaminas e de energias para que não fiquem fracos e acabem desaparecendo no jardim. Minha mãe costumava plantar cebola em pontos estratégicos, dizia que trazia proteção para as plantas mais fracas, principalmente para as queridas rosas. Não sei se é verdade, mas o resultado era sempre o esperado: elas ficavam lindas.

Caminhando pelo jardim podíamos encontrar diversas plantas, e as que mais chamavam atenção, como não poderia deixar de ser, eram as ornamentais. Elas escondiam suas fraquezas aos olhos, mostrando apenas o que era belo. Nela pequenas pragas cresciam e se multiplicavam de forma despretensiosa. Ácaros se moviam lentamente pelo jardim, contaminando outras plantas e causando uma destruição silenciosa. Contra o inimigo oculto venenos eram borrifados. Plantas sensíveis eram protegidas por plásticos, outras não se queixavam. O perigo estava controlado, e isso era uma preocupação que nunca deixaria de existir.

Minha mãe ficava ali por horas, mexendo com as plantas. Durante esse tempo quase sempre conversava com elas. Na minha infância, ainda inocente, não conseguia entender essa postura. Hoje ainda não entendo, mas pelo menos sei que não há nada de esquizofrênico em se conversar com plantas e aguardar por toda eternidade por uma resposta. Ela cuidava, amava e trocava confidências com suas amigas, e nessa troca apenas a promessa de que o segredo seria mantido.

Juro que tentei criar o mesmo costume que minha mãe. Quando fiz quatro anos ela me deu a primeira pá de jardineiro. Eu remexi a terra, fiz e desfiz buracos. Mas não via em mim nenhum sentimento de gratidão por parte daqueles seres, e alegria de poder estar ajudando, era quase nula. Pela minha mãe, e somente por ela, eu ficava horas naquele lugar, querendo entender muito mais o que ela falava do que as coisas que as plantas ouviam.

O tempo foi passando e eu acabei me interessando pelas pragas, que eram capturadas do jardim e mantidas secretamente numa estufa construída em meu quarto. Lesmas, caracóis, cochonilhas, pulgões, formigas e outros insetos menos conhecidos. Alguns eram capturados quase mortos, já sentindo o efeito do veneno que minha mãe espalhava pelo jardim, ou por algum tipo de planta que os deixavam atordoados. Na verdade eram poucos capturados vivos, podia contar nos dedos todos que conseguiram sobreviver.

Lembro da minha infância, assim no chão brincando com a terra. Olhando minha mãe cuidando das plantas, eu conversando com os insetos. Mas lembro mesmo é da última vez que estive no jardim da minha casa. Não era um dia de sol forte. Passei pelas rosas, procuro minha mãe. Ela já deveria estar ali cuidando de suas amadas, regando ou cortando as folhas secas. Na minha mão uma caixa de fósforo vazia, serviria de cela para algum animal que eu encontrasse pelo caminho. Vou andando pelos corredores do jardim, procurando pelos moribundos. Sinto um cheiro forte de inseticida. No chão, morta como qualquer inseto, encontro minha mãe. Ela estava segurando um regador em uma das mãos, na outra uma rosa branca. Naquele dia pude perceber a diferença que faz a ausência de qualquer Rosa.


(Trecho Publicação Folhetim Hoje é Vinte - 20/04/2007 - Publicação via e-mail)
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sábado, abril 14, 2007

Fotografia



Naquele dia, escolhi a imagem
pela sorte ou azar, quem sabe?
Em preto e branco, todos
perfilados em um único pensamento:
O aniversário do meu avô.
Por mais descolorido, nas
cores da pele, dos olhos e do cabelo,
eu sabia que estavam ali.
Na mesa que se armava de tábuas,
cobertas por uma toalha de flores,
e pratos tão coloridos, quanto
diferentes.
Todos estavam ali.

A foto daquela infância, guardada
e tirada ao acaso, serviu-me de
bússola para meus sentimentos.
Tão maravilhados, todos aqueles
que intatos, esperavam a oração;
dita interna, em silêncios poucos,
antes de partir o riso e o pão.

Colorido, a família da minha infância,
estava ali toda, esperando apenas
o vinho, o doce e a lembrança.

Naquele dia, em que escolhi a imagem,
restava um pouco de dor, de saudade.
Muito mais, na fotografia da minha infância,
todos que eu amava estavam ali.

sábado, abril 07, 2007

De Onde

E na noite, quando não há
flores, nem rostos conhecidos,
um mistérios tão indecente.
Nessa noite, sem acalanto,
onde espero, sem resposta:
O relógio pára, o vento da
chuva aparece e as vozes dos
lobos e dos outros bichos, surgem.

De repente estou no meio de um
lugar que mal conheço, e que soube
apenas pelos livros e filmes.

E na noite, quando espero alguém,
sem rosto, e que nos mistérios
transpiram respostas, surgem:
A alma flutuando, o corpo
tão apodrecido, sem fome, e qualquer
outra coisa que me faça sentir dor.

De repente estou no meio de um
caminho que desconheço, e que soube
dele apenas na consagração de um adeus.

quarta-feira, abril 04, 2007

O dia 10

O dia contemplativo, me absorve em sua imensidão.
Quem sou eu no meio de tantas coisas estranhas?
Um estranho que se diverte, uma coisa que se perde?
Moderadamente sinto falta de tudo, mas me completo.

terça-feira, abril 03, 2007

Pasmem



A situação é pior agora.
Faltava um bocado,
agora um pouco mais.
Mas ninguém liga, eu
mesmo já nem ligo.
E qualquer programa,
ainda que tarde, vale.
Um copo de gelo, cheio.
Ando bem cheio também.
Ponha ai qualquer bebida.
Não ligo, perdi o número.
Você que estava tão perto,
eu me achando tão certo.
É pior agora, tanto faz.
Escrevi umas coisas, e
você leu, assim mesmo,
sem nenhuma vontade.
Ponha qualquer coisa!
Meu copo, cheio de gelo,
é pior agora com sede.
Não vou te ligar, pode
esperar qualquer dia desses.
Que não vou te ligar mais.

A situação é pior agora.