"Morre mais um instante com os olhos cansados. Quem o reconheceria com aquelas roupas rasgadas e olhos tão profundos? Ninguém. Sequer a mãe, tão cheia de afeto e carinho, soube que naquele cheiro insuportável se escondia seu único filho, o mais querido...." - pg.1
sábado, dezembro 10, 2011
PÁGINA 09
sexta-feira, dezembro 02, 2011
A porta fechada
A porta e a tinta descascada.
Mostra a casa abandonada.
Fria, suja, as ruínas: solitária.
E bato e ninguém ouve.
Mas se movem, percorrendo
a nossa imensa memória.
Houve alguém um dia?
E a porta e o trinco
alguém silencia.
Bato até os braços cansarem.
O outro lado, o vazio enorme.
Quem de nós decidiu tanto
sobre nossa pavorosa vida?
Os planos expostos, a ferida
exposta; trancada, deprimente.
E bato e ninguém me ouve.
Houve alguém um dia,
mas e o trinco e a memória:
Alguém silencia.
E os abraços finalmente se cansam.
.
.
.
quarta-feira, outubro 19, 2011
Numa dessas noites de chuva
E te cobram, a densa força do pecado
um erro nada original, bastardo; penso.
Come a maçã, morde, assopra e beija:
A mulher dos seus dias, nua e verdadeira.
.
Penetro, abstrato: nas ruas carros passam.
.
É dia de chuva, mas a janela fica aberta.
Quem, em olhares santos; vê o que deve?
Cansada, fria; relaxa, mas nada devora:
Tantos homens e mulheres que passam.
.
Eu me alojo. Eu me renovo; eu me desespero.
.
É minha a sua mulher? Ou vice-versa?
De ninguém, ela repete a si mesmo
quando no espelho enfrenta o que sobrou.
E o pecado de ambos, num só recai:
.
Cruz do choro, da solidão e de tristeza.
.
O dia é de chuva, mas a janela fica aberta.
De ninguém, ela repete mais uma vez,
recebi qualquer beijo, de vingança ou ódio.
Eu me alojo. Eu me renovo. Ela se angustia.
.
Mas seu choro não é remorso, é desespero.
.
.
.
Em um cotidiano qualquer.
A herança é o fim do mundo: o presente.
O que mais quer, desisto hoje, para sempre.
Vamos tomar uma bebida?
Seguro o copo com as duas mãos:
- A bebida está quente?
A vítima dorme nos meus braços, ainda.
O perfume de ontem, hoje cheiro insuportável.
Os cadáveres que abominam os abutres
apodrecem para o resto da vida.
Seu presente hoje: o fim do mundo.
.
O mundo de hoje parece insuportável.
Desisto para sempre de tomar uma bebida.
Vamos falar sobre cinema?
Seguro seu braço com as duas mãos:
- Está indo embora?
O cadáver dorme nos meus braços, há vida.
Os abutres insuperáveis sobrevoam minha morte.
O fim do mundo, que resta do meu cheiro,
apodrece o que é o meu presente.
Vamos beber algo e esperar o fim do mundo?
.
.
.
.
terça-feira, outubro 18, 2011
Flores do seu jardim
quarta-feira, agosto 10, 2011
Carta
A proposta, enfim, foi aceita.
Recebi hoje, em letras concretas.
Destinatário com nome incompleto.
Remetente também desconhecido.
O assunto é novo, mas diferente.
Estarei no horário marcado,
com minha melhor roupa, e perfume.
Já é meu dia, chegou na hora certa.
E nosso encontro, marcado há tempo;
desde meu nascimento, pela vida.
Olhava para o futuro e te encontrava,
mas não tinha coragem, menos motivo.
.
Hoje ainda não tenho, mas aceito.
.
Li todas as linhas, o absoluto.
Já me disseram tudo que está escrito.
Todas as pessoas sabem disso,
principalmente as mais velhas.
Eu sabia, mas não queria pensar nisso.
Agora não posso, é tão perto e tão óbvio.
Não escaparei, nem mesmo pretendo.
Dormirei tranqüilo esperando o outro dia.
Como diz a proposta: não existirá mais.
E lá, nas entrelinhas, diz que eu posso;
em qualquer momento, recusar.
Mas eu olhava o futuro e sempre esteve lá.
Não tinha coragem, mas agora tenho motivo.
.
Amanhã não tenho mais.
.
.
terça-feira, junho 14, 2011
Eu silencio (O seu silêncio)
Amante dócil das frases soltas:
Gosto de ti quando ri, solta.
Gosto mais quando não me ignora.
E me pergunta coisas fáceis,
e diz que é mentira quando absurdo
(mesmo o absurdo sendo verdade).
E repreende minha loucura,
e sorri da minha tristeza,
e me adverte sobre o caminho
(Não me quer louco, triste e perdido).
.
Amante inexistente, eu andei pensando
em você muito perto, bem perto.
Vindo pelo corredor, entrando aqui
onde eu gosto de te ver (ler).
Não diria nada.
Também não há nada para dizer.
Talvez uma frase solta, sem sentido.
Nossa vida, ultimamente, tem mesmo
pouco sentido.
Um beijo tímido, outro não.
Iria rir também de ti e suas loucuras.
Viveríamos instantes,
o mínimo é o suficiente, sempre.
.
Mas não me venha, amante;
dizer-me coisas indecentes.
Da minha razão pelas coisas,
da minha indecisão sobre a vida,
da minha ansiedade.
Não diga nada, por favor.
Quando não há nada a dizer.
Gosto quando não me ignora,
Amo quando não me condena.
E louco, perdido ou triste,
não importa;
quando sua frase solta,
não diz a nenhuma verdade.
.
.
sexta-feira, junho 10, 2011
Sonho perigoso
Hoje aquele sonho desprevenido.
Estava acordado, zonzo; febril.
Estava com fome, mas não era fome;
nem sede, nem tristeza; nem morte.
Não era nada me fazendo.
Não era sua mão; nem seu lábio.
Nem dinheiro. Nem carros buzinando
evitando meu atropelamento:
E os braços e pernas, quebrados;
enquanto sonhava.
.
Sonho perigoso de sonhar acordado.
.
Não era um pesadelo, visto acordado.
Era delírio das coisas no seu devido lugar.
Estava o caos, instaurado o caos.
Ruiva brancura da noite,
visita a cama; o doente; o febril.
Inconseqüente eu sonhava.
Não era a mão, nem os lábios;
nem a língua; nem os braços.
Era a grama molhada, impaciente.
O grama de barro atolado
no calçado, na calçada; eu correndo.
Petrificado, preso; sonhava.
.
Sonho da vigília, do morto no caminho.
.
E a escuridão dos dias, do andar corrido;
não me faz sonhar acordado, nem lábios.
Nem vida surgindo do barro, e a língua.
Era o caos decifrado, na brancura da vida;
da ruiva grama da noite; a minha fome.
A mão que aparece, no sonho acordado;
é minha mão vazia.
Não é lisa, nem dócil; nem quebrada.
Era a grama queimada, a febre.
Era a vida correndo solta;
a falta de censura; era o pesadelo.
Era a falta da vontade, do desejo.
.
Sempre foi perigoso meu sonho acordado.
quinta-feira, junho 09, 2011
Lugar Errado
Estou preso e esquecido, enfim.
Tenho certeza que aqui o relógio erra.
E a passagem da vida muito mais.
Esse lugar, pintado em brasa;
É do meu inimigo da vida.
Dos tubarões famintos, mortos.
Do deserto sem grito, o frio.
Da floresta sem fome, quase extinta.
Onde tudo parece tão igual.
.
Os dias são iguais, imensamente iguais.
Ontem e o hoje, conectados ou não.
A sucessão dos passos, de sonhos.
Invariável série de ações:
Dormir, acordar e morrer.
A continuação das coisas,
prosseguimento das dúvidas e
prolongamento da dor.
Onde tudo parece não ter fim.
Os dias que acabam em sua imensidão.
.
Ontem e hoje, tão intensos.
Horas que viram noites e
sentimentos em solidão.
O lugar ideal, onde preso;
é o tempo que passa esquecido.
Dormir, morrer e acordar.
Numa continuação de dúvidas
Sobre a floresta ou o deserto;
Se vale a pena, onde tudo igual;
Esse lugar para continuar a viver.
Esse lugar que parece tão ideal.
sexta-feira, maio 27, 2011
A verdade curiosa da mentira
sexta-feira, abril 08, 2011
Risadas no Recreio!
O mar repulsa dores:
Enfim o pesadelo em verdade.
Que liberdade ele queria?
Isso ninguém sabe.
E os tiros, e a espuma;
E a baba de ódio como onda.
Que raiva ele tinha?
A cabeça a gente manda,
manda no dedo do gatilho.
Mas, às vezes, perde da sanidade.
Haveria sonho?
Todas as vítimas tinham,
estavam em seus futuros,
carregados de esperança e livros.
Tiros e tiros: esmo.
Escolhas aleatórias ou não.
Isso ninguém sabe.
Crianças do futuro também incerto;
Mas de luta, de coragem.
A coragem dele era outra:
Era covardia.
Ridícula, louca e inútil.
Se ele tinha sonho, se ele tinha problema;
Se ele tinha medo, se ele tinha fome.
Se ele tinha.......não tem mais.
E ninguém vai saber:
Ficou com ele e seu silêncio em suas dores.
Sua história resumida em seus passos
Dentro da escola.
E as crianças?
O mar repulsa as dores:
Tornaram-se heróis de verdade.
Eles fizeram história, sem saber:
Caminhavam também pela escola,
mas tinham outras idéias, outros amores.
Tinham outro valor da vida:
Valor que nos contemplamos agora;
e, mesmo no silêncio de agora,
preenchem a vida as lembranças
de suas risadas:
e da tragédia o eterno recreio é o que
verdadeiramente importa.
E isso todos nos saberemos.
sábado, março 26, 2011
Confesso: vivi.
.
.
Confesso: vivi.
Não foi fácil, decido sempre.
Um copo na mão, outro na mesa.
E o papel sem nome definido,
Sem planos e sem amor.
Mas, mesmo neste instante, vivo.
E a paisagem mudou.
A janela não é mais a mesma,
E o pingo de chuva que escorre;
Mata aos poucos o tempo.
Mesmo assim, vivi.
E se tenho tanto ainda para confessar,
Farei-o lentamente,
Como revivendo cada instante,
Cada pesadelo e cada alegria.
Uma tela repleta de sons e imagens,
O filme da minha vida
Passando lentamente,
Num chroma key instantâneo
Sem alegria; alegremente.
Confesso ainda: vivi.
E foi tão difícil continuar vivo.
Sem planos e sem amores;
Sem a janela por onde fugir,
Sem a porta e sem o letreiro:
Aqui jaz!
Não é fácil,
Mas vivo.
sábado, março 19, 2011
Texto Introdutório – Questão filosófica: A batalha entre o Céu e a Terra!
Dentro de mim uma batalha se instaura. Parece uma batalha antiga, mas não eterna. A briga que surge quando me vejo no espelho; quando percebo o que parece ser a questão de toda minha existência. Na imagem dois personagens. Dois símbolos contraditórios. Ali, os dois ícones revivem a história, desde os tempos antigos até os dias de hoje. Caim e Abel[1], se misturando na imagem refletida.
Em mim a ciência da concepção da carne e a consciência do espírito criado. Dois irmãos que brigam em minhas escolhas. O que eu sou afinal? De onde eu vim? Para onde eu vou? Nenhum deles consegue responder ao certo. E os dois continuam brigando pela verdade. Ou vivo como Caim ou mato-me como Abel[2].
Afinal, quem em mim é eterno? Haverá essa eternidade ou é a sensação de conforto que tanto buscamos. É confortante saber que nada acaba aqui, mas e a verdade? Criamos Deus ou ele nos criou? Enfim, os dois irmãos ditando a regra entre a crença e o ceticismo, entre o mundo material visível e o invisível mundo espiritual.
De repente, diante do espelho; os dois irmãos desaparecem. Ali eu percebo que sou único, não o único. Existem milhares de pessoas por perto, seus barulhos, vozes e cheiros. Mas não existe no meio de tantos deles igual a mim. Todos sofrem consigo mesmos como eu sofro diante de minha imagem dilatada? Sofro por não saber qual a vida devo ganhar[3].
E mais uma vez os dois irmãos reaparecem: eles representam meus dois pensamentos sobre o mundo, sobre quem eu sou. Não posso detê-los. Eles sempre aparecem com a mesma questão, com os mesmos argumentos. Mas não definem suas respostas. Nenhuma dessas visões, em mim; chegam perto do que considero a realidade.
Caim matará Abel sempre? Qual deles eu quero como assassino? A sensação de Caim, o profano; ou o poder de Abel, o eterno? [4] Caim, que é minha vida material; minhas conquistas, o meu mundo atual; mata todos os dias Abel, minha vida eterna; eu no mundo espiritual. Este mundo eu não reconheço com facilidade, e aquele eu sei o que quer.
E a batalha que parece guerra, me dá uma única diretriz. Responder essa questão é definir o rumo de tudo que eu quero, de tudo que eu preciso, de tudo que eu sonho; quais serão minhas conquistas, o que será a felicidade. Nessa guerra, em que aspectos físicos e espirituais se confundem; devo escolher se sou um ser espiritual em carne ou a carne em espírito?
A noção primária de todas as coisas: onde eu estou nesse tempo e espaço? Num primeiro instante parece que sou esse corpo, que sente fome e sede. Sente desejos. Mas no resplandecer do corpo vejo-me muito maior do que tudo isso que penso ser agora. Devo mesmo ignorar a sensação de que sou mais do que o que me vejo agora? [5]
Ao certo, parece que a convivência da vida me faz desse jeito. A questão que agora pouco me afligia, some. Mas é por um breve espaço de tempo: quando as coisas do dia-a-dia acontecem, desisto de pensar no que eu realmente sou. Mas, de repente, fico paralisado com a questão: Sou espírito que possui um corpo ou um corpo que possui um espírito? E a guerra, e os personagens, nunca desaparecem.
É conveniente vivermos a vida do mundo, sem pensar o quanto podemos nos transformar[6]. É mais fácil esse caminho. Decidir que devemos continuar levando a vida, que por si já basta. Mas não quero as coisas fáceis, quero novamente me olhar no espelho; quero me rever diante dele: quem eu sou afinal? Que conhecimento pode me responder?
Talvez a lógica, logos. Talvez o oposto, Lúcifer. Conhecimento diferenciado entre a crença e a ciência. Saber é muito diferente de acreditar. Por isso sabemos pela ciência e cremos pela religião; e ambos vivem em lados apostos. Quem não quer conhecer a si mesmo, acaba de uma só vez com a charada: a mentira, no entanto, não liberta. “Ó homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo”[7].
Muitas dessas respostas comprovadas, determinadas e positivas não respondem parte de minha dor. Aliviam, decidem. Mesmo quando é o inverso do que esperamos: a ciência não quer deixar dúvida. Mas acaba deixando. Acaba por não responder algumas lacunas que se formam: nós somos maiores que a ciência e a religião, precisamos de mais.
No espelho a metáfora continua. A briga entre os dois irmãos que podem responder que lado eu quero ficar, que lado eu quero percorrer para achar as respostas que me irão satisfazer. A advertência velada para Caim, que decide por um caminho longo que agrada a si mesmo; mas que não é a representação do que o mundo quer. Ou advertência direta a Caim, que vive o mundo visível; fazendo aquilo que é gostoso[8], aquilo que parece contentar todo mundo. Faço aquilo que eu não quero apesar de querer aquilo que não faço, Paulo de Tarso traduzindo toda essa minha angústia em sua frase célebre das Cartas.
Abel não agrada ao mundo, mas mapeia sua felicidade eterna. Caim se satisfaz como mundo, mas sua contemplação é transitória. Caim, que é feliz; inveja Abel. Por essa inveja o mata. Qual a razão desse desgosto com o irmão? Qual a razão do ciúme doentio? Caim mata Abel por esse motivo: eterno versus transitório. E esse o símbolo mais disfarçado em nós, real e provisório se digladiando. O corpo contra a alma. Matéria inveja o espírito. Homicídio do início da minha história, revividos ainda hoje. Mais uma vez eu pergunto: em mim, até quando Caim (matéria) matará Abel (espírito)?
Os personagens poderiam ser renomeados por Jung: Self e Ego. Ego que é passageiro, o denso; a prisão. Ego que educa para o egoísmo; pecado de todas as instâncias do crime da consciência. Ego que é a matéria que não brilha em nenhum ensino prático, que não se transforma como Siddhartha na iluminação de Buda. Ego que mata a vida em Paulo, o opositor de Deus de Cristo no deserto. Ego das passagens das intermináveis horas de Fernando Pessoa. Ego de Rohden: aquilo que é profano, o ego luciférico.
O Self da alma. A suavidade da libertação. O que libera em nós o Reino dos Céus. O Iluminado. O que vive no amor eterno. Na disciplina religiosa, na harmonia espiritual. A contemplação de Deus. A mistura de Deus em nós, nós em Deus[9]. Estamos nele, mas não somos Ele. Self de Abel, que agrada Deus[10]. Self do espírito que vivencia a magnânima vida eterna. Que tudo sabe; “em espírito e verdade” como revelados à samaritana, por Cristo. Self que sabe ao invés de apenas crer. Que tem ouvidos de ouvir e olhos de ver[11]. Que ressuscitamos sempre, depois da crucificação[12] do ego. Self do si mesmo[13]. Self do Eu-crístico que combate Ego-Luciférico.
O material e espiritual: Caim e Abel. Cristo e Lúcifer. A proibição de servimos a dois senhores: Deus e as riquezas[14]. Deus e Mamom[15]. Ego-material e Self-espiritual. Estou como um ego mortal, mas sou um Self imortal. A iluminação, a evolução é o reconhecimento do Self, o abandono da ditadura do Ego.
Essa dualidade já foi pensada no passado, antes mesmo da história contada de Jesus de Nazaré. Dualidade que temos em Heráclito[16], que numa questão de proporção universal nos diz que O ser não é mais do que o não-ser[17]. Poderia sugerir uma briga entre o espiritual e o material, entre subjetivo e o absoluto; entre tantas dicotomias dos pesadelos diários de qualquer filósofo[18]. Sócrates, Platão e os neplatônicos.
E o que dizer dos momentos que precedem o nascimento de Jesus, quando Herodes, em seu Ego-material, tenta manter o seu reino temporário, percorrendo todos os cantos do seu reinado a procura da criança self-espiritual do nascimento de Cristo? [19]. Quantas vezes em nós, que matamos Abel; tentamos também extinguir a manjedoura do nascimento de Cristo em nossos corações? Poderíamos fazer como os Reis Magos, que guiados pela estrela de luz[20], contemplam Jesus com presentes. Reis, como representação de grande poder do homem; e magos como a representação espiritual[21]. Mas relutamos em seguir a estrela, em transformar nossos corações em nascedouro; ou mesmo zelar por Cristo em nós como fizeram os pastores.
E meu corpo continua na indisciplina da mente, dos meus diversos corpos; dos meus desejos e sensações. A batalha que outrora havia começado, continua no meu semblante sisudo diante do espelho. Quanto tempo eu ainda tenho para decidir o que eu quero da minha vida? É complicado: estamos tão acostumados com as riquezas, com os tesouros mensuráveis; com ganhos palpáveis. Nossa mente educada há séculos pelo princípio do prazer e da sensação momentânea.
O nosso corpo e nossa alma, numa batalha sangrenta e dolorosa; como Caim e Abel. Um aniquilará o outro, é o destino. E nessa luta, que escudos podem me proteger? Quais as armaduras que eu devo carregar? Não vim trazer a paz, mas a espada como nos disse Jesus. A guerra da inquietude da minha alma, com a imposição do intelecto, são as diretrizes que me suportam.
Penso logo existo. Mas quem existe primeiro? Caim em mim, brigando pela pedra no deserto, querendo prova de Deus, se jogando no penhasco para ser socorrido por anjos? Ou em mim Abel, procurando a água da vida, a crença em Deus em verdade. O Reino dos Céus em nós mesmos? Vós sois Deuses!
E quando a guerra acabar? O perdedor morto. Abel nunca morre; resiste. O destino de Abel é vencer a batalha. Em Caim o recomeço, a nova chance; a ressurreição descrita em João. Quem não nascer de novo não entrará no reino dos céus, Jesus disse a Nicodemos. Que eu saiba renascer; que em mim habite a pedra que edifica; não o engano que se opõe; como se sucedeu em Pedro antes da revelação da crucificação de Jesus: “Saia de mim satanás, se opondo ao designo de Deus”- Disse Jesus à Pedro naquela oportunidade.
Não é fácil, mais uma vez nos desculpamos[22]. E no recomeço preferimos que a pedra se transforme em pão. Que os anjos nos socorram, quando nos atiramos no abismo para saber se Deus realmente existe. Quando achamos que somos o único, ao invés de únicos. Quando criamos os atalhos de nossa compreensão.
O modelo que não é fácil de seguir, para escolhermos quem viverá da nossa dicotomia; disposta há mais de dois mil anos com Jesus de Nazaré, em suas chagas, exemplos e virtudes. O caminho, a verdade e a vida. Onde o grande mestre nos apronta para a realidade, de que somos eternos, que valemos pela nossa indivisibilidade: Abel sempre existirá, e é ele o escolhido para viver no gozo do senhor.
Jesus de Nazaré, que se transformou em Cristo. Que já sabia desde os doze anos, que a contradição entre ego (matéria) e o self (espírito) tinha uma única solução: cuidar da alma, dos negócios do Pai. Jesus que morreu por nós, não pelos nossos pecados; mas para exemplo de nossa salvação. Jesus de Nazaré que chegou em Cristo, para as várias moradas. Que submisso a Deus, como Abel; soube o que fazer para agradar. Abel do simbólico Velho Testamento; de Jesus do Novo Testamento; ambos transformados em pastores.
E no espelho, em que meu reflexo diz o que eu estou; o refletido responde quem eu quero ser.
[1] Caim e Abel eram irmãos. Apresentados no Velho Testamento como primogênitos de Adão e Eva. Caim era mais velho do que Abel.
[2] Caim (lavrador) e Abel (pastor) apresentam ofertas a Deus. Caim apresentou frutas do solo, Abel apresentou primícias do seu rebanho. Abel agrada Deus com sua oferta.Com ciúmes, Caim arma uma emboscada para o irmão. Caim mata Abel.
[3] “Porque, quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas quem sacrificar a sua vida por amor de mim, salvá-la-á”. (Lc 9,22)
[4] Passado algum tempo, ofereceu Caim frutos da terra em oblação ao Senhor. Abel, de seu lado, ofereceu dos primogênitos do seu rebanho e das gorduras dele; e o Senhor olhou com agrado para Abel e para sua oblação, mas não olhou para Caim, nem para os seus dons. Caim ficou extremamente irritado com isso, e o seu semblante tornou-se abatido. O Senhor disse-lhe: “Por que estás irado? E por que está abatido o teu semblante? Se praticares o bem, sem dúvida alguma poderás reabilitar-te. Mas se precederes mal, o pecado estará à tua porta, espreitando-te; mas, tu deverás dominá-lo.”(Gn 4,3-7).
[5] “Jesus então lhe disse: Feliz és, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne nem o sangue que te revelou isto, mas meu Pai que está nos céus”. Mt 16,17
[6] “Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso espírito, para que possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe agrada e o que é perfeito”. Rm 12, 2
[7] Inscrição no oráculo de Delfos, atribuída aos Sete Sábios (c. 650a.C.-550 a.C.)
[8] A batalha em nós se desenvolve muito pela decisão entre aquilo que é certo e aquilo que é gostoso. Entre aquilo que é trabalhoso e aquilo que é confortante.
[9] Panenteísmo - Todas as coisas estão na divindade, são abarcadas por ela, identificam-se (ponto em comum com o panteísmo), mas a divindade é, além disso, algo além de todas as coisas, transcendente a elas, sem necessariamente perder sua unidade (ou seja, a mesma divindade é todas as coisas e algo a mais). Wikipédia, consulta em 12/09/2010.
[10] Passagem da Gênese Judaica.
[11] Nota do Autor: A cura de Jesus de alguns cegos, coxos, surdos e aleijados; podem ser a representação da nossa própria cura, em decidirmos olhar para a verdade, deixarmos de andar de forma curvada, como se não fóssemos soberanos filhos de Deus.
[12] Crucificamos o Ego.
[13] Inglês.
[14] “Quem não deixar tudo não pode ser meu discípulo!” – Jesus de Nazaré.
[15] Mamon é um termo, derivado da Bíblia, usado para descrever riqueza material ou cobiça, na maioria das vezes, mas nem sempre, personificado como uma divindade. A própria palavra é uma transliteração da palavra hebraica "Mamom”, que significa literalmente "dinheiro". Wikipédia.
[16] Heráclito de Êfeso, filósofo pré-socrático.
[17] Nesta sua frase, Heráclito já definia a dualidade das coisas do mundo.
[18] Gandhi fala sobre o puro e o impuro.
[19] “Venham a mim as criancinhas, pois delas é o reino dos céus”
[20] Nota do Autor: Que pode ser interpretado também como uma luz interior.
[21] Rei é a figura do homem de grande prestigio e Mago de grande poder sabedoria.
[22] A porta pequena.
quarta-feira, fevereiro 09, 2011
FOLHA 10/05 – PAIXÃO SEM CAUSA
quarta-feira, fevereiro 02, 2011
Cartas ao vento 031
quinta-feira, janeiro 27, 2011
A casa
As paredes velhas, tão velhas.
Já eram velhas quando corria
descalço pelos corredores.
Hoje mais velhas ainda.
Não corro mais, nem ando.
Nem sinto gosto da comida,
Nem choro pelas lembranças.
Naquela casa, com paredes
Elas não me aprisionavam
Agora são meu tormento.
A casa velha, com cheiro
De comida, de pessoas;
De um perfume pela sala.
.
Não posso ficar aqui,
Nessa casa, nessas lembranças.
A casa não existe mais.
.
Apenas nela, solitária,
os fantasmas da vida.
Hoje mais velhos, ainda.
Sequer posso entrar,
Sentar-me no sofá,
Ler o jornal e tomar café.
A vida não é mais minha,
Nem a casa de todos nós.
Agora a casa é um tormento,
Sem paredes, sem pessoas;
Sem ninguém para tomar conta.
As plantas danam no chão
O resto de incerteza nos pés,
Sem qualquer leveza.
.
.
.
.
sexta-feira, janeiro 21, 2011
Caminho torto
que matava dragões e usurpava espadas preciosas.
Queria que me olhasse como todos esses humanos,
que choram de noite, que precisam de colo.
Que bebem água, com sede; das cachoeiras brilhantes;
que roubam estrelas, sentem pena da morte;
que voam lentamente, livres; num ritual angélico.
Queria eu fosse esse santo dos milagres humanos,
que acaba com a fome; que saciam as dores;
que inventa sonhos.
Queria ser um pouco melhor do que sou,
caminhando na chuva, nas ruas de paralelepípedo.
Que achasse graça das gotas, que me jubilasse nos rios.
Que ouvisse o cão raivoso na beira da estrada,
pensando como eu seria em seu desprezível lugar.
Queria que não me deixassem de lado,
como se eu não precisasse de ninguém.
Não pudesse ouvir a campainha de casa, numa noite
de tempestade e negridão por todos os lados,
onde eu não conseguisse dormir direito
com medo do que sou realmente capaz:
.
.
nessas noites infames, me perturbam as más.
Queria merecer a reverência agradável;
Que sustenta o corpo humano cansado, e
alimenta o sentimento pelas coisas comuns.
Mas, desse alimento, outrora atrapalha a vida
nos confins do mundo eterno,
onde as asas são imprestáveis ao vôo,
e as espadas inúteis a guerra.
.
contasse mais uma vez a história,
que sabe, acha ou pensa de mim.
Que as coisas boas fossem pequenas,
e que o caminho torto não apenas o fim.
Queria ser melhor do que sou,
de uma lenda que parece confusa,
mas nessas palavras inversas, resolve;
como a vida na morte parece fazer.
.
.
.
.
quarta-feira, janeiro 19, 2011
Acordei
Meus pés acorrentados;
Enfim, acordei.
Mas acordei assustado.
Olhos cansados, cabelos molhados.
O corpo suado, denso.
Acordei com medo, o que é pior.
Pior que a morte, o sono e a fome.
Acordei sozinho, em silêncio.
Do vôo longe, inconsciente.
E as pernas cansadas da procissão.
Desamparo do ideal.
Acordei sozinho.
E as cartas que voaram longe, sem ninguém.
Pois em um momento, cansei de todos.
Enfim, acordei.
E voei alto nos pensamentos impróprios.
E decidi a morte.
E contra a crença não se pode.
Morri aos poucos, totalmente vencido.
Mas, enfim, acordei.