segunda-feira, maio 28, 2007

Contando as horas

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Talvez esteja mesmo errado, contando
minutos esperando o dia acabar de vez.
Não é mesmo assim que as coisas são.
Um recomeço no instante, na rua que
devemos seguir para o trabalho, a comida
que engolimos sem perceber o gosto, o
gracejo, o filme e o beijo que perdem sentido.
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Se vamos recomeçar, o dia está propício.
Não há torrentes, nem abismo mais; nem
escuridão que nos acompanha. Em compensação
não existe absolutamente mais nada, para recomeçar.
Vamos, então, começar: do nada, do vazio, do tédio
Vamos começar do inacabado, do obscuro; do quê não
faz a menor diferença: se vivo ou morto.
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Ouvir outras músicas, escrever com outra caneta,
Jogar fora o tênis, as roupas. Andar suavemente
pelas ruas, esquecendo do compromisso.
Adeus, relógio! Minha cor preferida, mudarei.
Minha crença, meus amores, minhas lembranças,
Meu futuro, meu presente; minhas coisas:
mudarão sempre, para sempre.
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Quem é você que, imutável, se sentirá feliz?
Ninguém responde pois toda consciência muda.
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Quero outro prato, outro lugar preferido para sentar:
no restaurante, no cinema, na praia; em qualquer lugar.
Quero outros livros, outros autores, outras amantes que nunca
ouvi dizer segredos em meus ouvidos.
No pulso, no chaveiro; o amuleto da sorte será outro.
Minhas palavras, ao acordar de manhã; e
perceber tantas coisas iguais a ontem, serão outras.
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Minha vida perderá o sentido, mas não haverá
tempo suficiente para decidir qual o caminho.
O lugar será sempre o novo, o incerto;
caminho jamais percorrido.
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Mas no mesmo instante
que me absorve o medo; também
nos dias contados, de novo;
o zero, o início, o grito do parto.
Um ser jamais renascido.

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