terça-feira, abril 23, 2013

Recomeçar não existe.


E se pudéssemos recomeçar? Por onde começaríamos? A pergunta é séria. Metaforicamente recomeçaríamos quando possível ou quando conveniente? O grande problema do homem: recomeçar apenas quando convém, quando o certo seria recomeçar sempre. Ninguém pode recomeçar senão renascer, dizia o profeta de Nazaré. Entre o ventre, apenas o nascimento; no calendário dos dias, o recomeço. Recomeçamos sempre, mesmo quando não percebemos. Mas o recomeçar é mais do que imaginamos, é anular o que existiu; é largar a bagagem do tempo para trás, trazer apenas roupas novas.

Não existe qualquer recomeço sem rompimento. É impossível renascer pelos velhos paradigmas. Uma roupa velha no remendo de uma roupa nova, mais uma vez o profeta certeiro em sua filosofia do mundo. Para renascer é necessária uma viagem intensa no Universo, nas construções grandiosas do mundo em que vivemos; sem tempo e espaço. Mais ainda: indeterminar horas, os momentos; optar pela eternidade dos acontecimentos. De hoje em diante não existe, existe o futuro. Mais do que a excursão no Universo, também é preciso a incursão do ser humano: gnothi seauton, conhece-te a ti mesmo! A pessoa que quer recomeçar e não sabe suas capacidades continuará sendo a mesma pessoa sempre, com outros pensamentos. O recomeço é a autotransformação.

Naquele tempo, um homem surgido do povo liderou um pensamento, em sua coerência, nossa repleta incoerência. Dizia que o homem que quer recomeçar precisa  largar tudo. Não é uma questão material, mas de conceito. Podemos ter coisas, mas não precisamos ser possuídas por elas. No mundo atual somos dominados pelo consumo: pelo celular novo, pelo carro do ano; pelo equipamento mais potente. Pior ainda: somos dominados pelo nosso passado, principalmente pelos erros. Ao homem não é facultado esquecer o passado, mas lhe é dado o poder de se perdoar. Naquele dia, quando o profeta escolheu seus seguidores, todos deixaram suas redes e seus barcos; não é possível recomeçar carregando o velho homem, ele dizia indiretamente.

Mas tudo isso é simbolismo, ninguém precisa se indispor com suas conquistas, mas é inevitável que o nascimento venha somente para quem tenha coragem de demolir, acabar; destruir e morrer seu passado. Não há como ignorar os acontecimentos pretéritos, mas existem escolhas para os acontecimentos futuros. A escolha pelo recomeço é a escolha divina, escolha sublime; poder sobrenatural de nossas vidas. Somos capazes sempre de recomeçar, e se a cada recomeço não tiver a característica do nascimento, não valerá em nada a empreitada. O recomeço, assim, será sempre e exclusivamente um começo.

Nascemos com intenção de recomeçar, seja na crença da reencarnação; na crença do nascimento pós-morte; ou em crença nenhuma. O poder intelectual, a força e o desejo do recomeço, da reconstrução é superior ao mistério da vida. Muitas vezes cavamos os escombros de nossas existências procurando alimento, água e felicidade; quando neles só podemos encontrar a dor, a depressão e o arrependimento. Não sabemos olhar para a liberdade, para o corpo livre e a mentalidade soberana. Não conseguimos ver nossos pés sobre o entulho; pois decidimos sempre estar soterrados por eles.

É inevitável reviver o passado para qualquer recomeço, mas nos basta querer o nascimento para que tudo que façamos de hoje em diante seja sempre visto como um começo, um nascimento; a vida surgindo todos os dias.